Nada mais seria de esperar de um grupo inovador e quebrador de tabus, como os Deolinda definitivamente são, que inovar ao nível de arquétipos culturais. A contrapor com as cantigas do bandido ao ritmo hip hop dos Doninha (de quem, de resto, gosto, apesar de objectar um tantito a algumas das suas letras), vêm os Deolinda pôr as coisas em pratos limpos: isto do amor é daquelas coisas que acontecem, transpondo barreiras de politica e culturalmente correcto. As pessoas gostam, simplesmente umas das outras.
Desta história de amor, de paixão assolapada por um músico numa banda, e não, não estamos a falar do glamour sex&drugs&rockn'roll de uma banda qualquer, mas banda de música das de fardas iguais, trompetes e oboés e aberturas de Bethoven assassinadas, toda uma mensagem e esperança e liberdade emana. Uma verdadeira lufada de ar fresco no panorama desta sociedade pós-moderna.
Somos todos uns snobes, não, não objectem, somos mesmo. Somos incrivelmente snobes a propósito a roupa que vestimos, dos carros que conduzimos, dos nossos amigos e dos dinheiros que temos ou não temos, dos sítios que frequentamos, e muito, mas muito mesmo, da música que ouvimos. Ser-se jovem implica romper com os hábitos dos nossos pais, com os gostos dos nossos pais, e isso é verdade sobretudo a propósito de música. Se as adolescentes de hoje não objectam a usar as leggings vintage da adolescência das mãezinhas delas, podem acreditar que objectam a ouvir as músicas que lhes encheram os ouvidos (voltem, A-HA, estão aperdoados). Então se falarmos de músicas anteriores a isso, como o fado, ou a música clássica, a reacção é de puro asco. A Mariza e a Ana Moura resgataram um pouco o fado para ouvintes contemporâneos (apesar de Amália ser ainda, por mais hereje que isso pareça, a epítome do uncool), nem o inegável sex appeal dos Il Divo consegue fazer com que gostar de música clássica seja aceitável. E mesmo que não gostemos de música clássica (que gosto), o namorar com um elemento de uma banda filarmónica torna-nos geeks por associação. De modos que este Fon Fon é uma lufada de ar fresco: quem somos nós para pôr limites ao amor?
Isto do amor eve ser como o sol, e nascer para todos. Camaradas uncool, unamo-nos numa só esperança: o fonfon é que conta, e não os nossos hobbies, ou gostos ou whatever. E os arquétipos culturais que vão ver a banda passar ;)
Olha a banda filarmónica,
A tocar na minha rua.
Vai na banda o meu amor
A soprar a sua tuba.
Ele já tocou trombone,
Clarinete e ferrinhos
Só lhe falta o meu nome
Suspirado aos meus ouvidos.
Toda a gente fon-fon-fon-fon
Só desdizem o que eu digo:
"Que a tuba fon-fon-fon-fon
Tem tão pouco romantismo"
Mas ele toca fon-fon-fon-fon
E o meu coração rendido
Só responde fon-fon-fon-fon
Com ternura e carinho.
Os meus pais já me disseram
"ó filha não sejas louca!
Que as variações de Goldberg
P'lo Glenn Gould é que são boas!"
Mas a música erudita
Não faz grande efeito em mim:
Do CCB gosto da vista,
Da Gulbenkian, o jardim.
Toda a gente fon-fon-fon-fon
Só desdizem o que eu digo:
"Que a tuba fon-fon-fon-fon
Tem tão pouco romantismo"
Mas ele toca fon-fon-fon-fon
E cá dentro soam sinos!
No meu peito fon-fon-fon-fon
A tuba é que me dá ritmo.
Gozam as minhas amigas
Com o meu gosto musical
Que a cena é "electroacustica"
E a moda a "experimental"...
E nem me falem do rock
Dos samplers e dicotecas,
Não entendo o hip-hop,
E o que é top é uma seca!
Toda a gente fon-fon-fon-fon
Só desdizem o que eu digo:
"Que a tuba fon-fon-fon-fon
Tem tão pouco romantismo"
Mas ele toca fon-fon-fon-fon
E, às vezes, não me domino.
Mando todos fon-fon-fon-fon
Que ele vai é ficar comigo!
Mas ele só toca a tuba
E quando a tuba não toca,
Dizem que ele continua
Quem em vez de beijar ele sopra
Toda a gente fon-fon-fon-fon
Só desdizem o que eu digo:
"Que a tuba fon-fon-fon-fon
Tem tão pouco romantismo"
Mas ele toca fon-fon-fon-fon
E é a fanfarra que eu sigo.
Se o amor é fon-fon-fon-fon
Que se lixe o romantismo!
1 comentário:
Deolinda são de facto geniais!
Que mais há a dizer?!
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