terça-feira, outubro 28, 2008

Alta fidelidade

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Rob: [lying in bed imagining the scene] You are as abandoned and noisy as any character in a porn film, Laura. You are Ian's plaything, responding to his touch with shrieks of orgasmic delight. No woman in the history of the world is having better sex than sex you are having with Ian... in my head"
A personagem principal deste livro tem um problema muito grande (para além de ser um trintão Peter Pan fóbico de compromissos): a namorada deixou-o. Aliás, não só o deixou como o sucessor dele é o vizinho de cima, por demais musculado. Em suma, um espécime superior. Ora o desgraçado passa a vida a torturar-se com fantasias com a ex e o seguinte. Na cabeça dele ela nunca tinha tido tanto prazer como com o seguinte, e isso matava-o. Isto é interessante, porque expõe um aspecto essencial da psique masculina: os homens só dão valor às mulheres quando as perdem. Sobretudo para homens, na sua cabça, superiores. É uma afronta ao ego masculino.
Se repararem nos grandes êxitos dos cantores românticos dos últimos cinquenta anos, verão, com toda a certeza e sem lugar para dúvidas, que consistem num bando de choraminguices de gajos que fizeram asneira e estão a tentar reconquistar, por assim dizer, terreno perdido.
O curioso nisto tudo é o diferentes que nós somos. Nós preocupamo-nos de véspera com quem nos antecedeu e com quem nos sucederá. Eles apenas se preocupam com quem os sucede e só no sentido de poderem ser ultrapassados. Acho que esse é também o motivo de os homens se sentirem traídos por uma traição física mais que por uma emocional. Sentimentos nobres e conversa sentimental estão eles fartos de saber a treta que é (a maioria simplesmente diz o que acha que queremos ouvir e siga para bingo). Sexo que é sexo é que é traição a sério e os emascula, os diminui enquanto homens.
A solução que o desgraçado do livro encontrou foi a mais evidente: curar-se de ser parvo, Peter Pan e fóbico de compromissos. Afinal, a culpa de levar consistentemente patins e ser substituido por versões melhoradas era dele. Desgraçadamente a maior parte dos homens não tem esta clarividência. Antes tivesse. Mas é um bom exemplo para os homens. Pensem prendas de natal...

segunda-feira, outubro 27, 2008

quarta-feira, outubro 15, 2008

From G's to Gents - uma solução

A MTV já não é o que era. Já não passa a música mais importante das gerações, marcando gostos e estilos de vida. Das poucas horas de música que passa, passa o pop mais pastilha elástica possível, o mais comercial e rasca possível. O resto das horas de emissão são dedicadas a reality shows de gosto duvidoso, onde gente é feita à medida, carros e caravanas são amaricados com tunning e famosos mostram o seu duche onde cabem doze pessoas. Em suma, o ideal para matar tempo, e neurónios de puro aborrecimento.
Mas alto, que é isto que se avista ao longe, um pássaro, um avião? Não! Um programa de interesse. A MTV alemã (que isto de se ser teutónico é outro estilo) tinha, há alguns meses atrás um programa fascinante. Trata-se do aclamadíssimo From G’s to Gents, e tem como missão pegar nuns tantos gajos com a mania de ser gangsta e transformá-los em perfeitos cavalheiros, o que é, sobre todas as perspectivas que se olhe a coisa, um objectivo muitíssimo louvável. Sim, que tudo o que tenha que ver com o melhoramento geral da espécie masculina para nosso maior proveito é sempre bom e agradecido.
Nos últimos anos, vi mais metros de boxers de adolescentes que aqueles que gostaria de ter visto. Com o morrer da cultura grunge e consequente abolição de cintos, atacadores e outras formas de manter a roupa próxima de si mesmo, os boxers viram, literalmente, uma nova alvorada. Gangsta que é gangsta, se não mostra ao menos quatro dedos de boxers está socialmente desgraçado. Gangsta que é gangsta se não chama dama à sua miúda e lhe aprecia partes avulsas e desproporcionais ao conjunto (are you an ass man or a breast man?) não merece o ar que respira. A cultura gangsta emanada do rap e do hip hop da moda é extraordinariamente chauvinista. Diz a Pink, e muito bem, no seu Stupid Girls :
“What happened to the dreams of a girl president ?She's dancing in the video next to 50 Cent”
É que nem o eye candy que é o 50 cent sem t-shirt compensa a indignidade de ser uma espécie de objecto giro e, de preferência mudo e outras Rihannices como essas. Assim um programa intensivo que os ensine a ser cavalheiros parece-me absolutamente necessário. Ah, olharem-nos para a cara e não para vinte e cinco centímetros mais abaixo! Ah, o tratarem-nos como criaturas com cérebro, abrir e fechar portas em vez de gritar Damaaaaaaaaaaaaa é logo outro estilo de vida… Isso sim é, a meu ver, serviço público e em prol da comunidade…
Não vi o resultado final da coisa. O episódio que vi tinha os rapazes a meio caminho, já de blazer e boas-maneiras moderadas, mas ainda com addidas brancas caríiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiissimas e sotaque “à gueto”, para parecerem mais duros (mesmo se o mais próximo que tenham estado de um tenha sido a ver as reportagens alarmistas sobre a Cova da Moura na televisão). Mantenho, mesmo assim, o espírito positivo: melhores que o que eram, têm de ter ficado.
Cá em Portugal, atrasados como estamos, parece-me que o programa não passa. Mas a minha cabeça, sempre cheia de uma quantidade incrível de inutilidades, apressou-se logo a traçar uma acção de formação, umas 50 horas, para transformar os gangsta tugas em qualquer coisa remotamente parecida a cavalheiros. Aí vão os conteúdos das sessões. Aceitam-se inscrições, e, como sou uma cidadã com apurado sentido cívico, o curso é gratuito.
Sessão 1- Cuidados básicos e higiene pessoal: os pentes são nossos amigos. Discussão de grupo. Role-play. 4 horas
Sessão 2- Vestuário e moda: como comprar roupa efectivamente do nosso tamanho.Serei um M ou um XXXXL? Desocultação de etiquetas. Sessão de treino com manequim. 4 horas
Sessão 3- Continuação da sessão 2. Elaboração de mnemónicas. Queima em grupo de sapatilhas addidas e sweatshirts 5 tamanhos acima. 4 horas
Sessão 4- As jóias masculinas são o anti-cristo. Palestra e discussão em grupo. 4 horas
Sessão 5- Sou um agarrado de bling bling, e agora? Terapia psicológica (escola Jungiana). Estratégias defensivas contra relógios com brilhinhos neles. 6 horas
Sessão 6- Formas de tratamento feminino: o “Dama”, anátema de vocabulário. Palestra e Role-play. 6 horas
Sessão 7- serei um idiota porque trato as mulheres como objectos? Discussão de testemunhos reais. 6 horas
Sessão 8- O cérebro feminino, mito ou realidade? Palestra com médica convidada. 4 horas
Sessão 9- O cérebro feminino, mito ou realidade? Discussão/terapia de grupo (escola freudiana). 4 horas
Sessão 10- Abrir portas e tratar as mulheres como seres pensantes e com vontade própria causa impotência? Desmistificação da cabala. Teste prático. Entrega de diplomas. 8 horas

terça-feira, outubro 07, 2008

O mundo está cheio de gajas (e de gajos)


Quando olho para trás e me ponho a lembrar de como era eu e, por inerência, o grupo de que fazia parte, só posso constatar o auto-importantes, convencidos e armados em bons que éramos. Metidos até às orelhas no existêncialismo less than zero da geração X e da cena independente/alternativa politicamente empenhada, achávamos que, francamente, éramos os donos da verdade. Felizmente essa certeza passou, bem como a auto-importância e o proselitismo intelectual. Tenho o prazer de constatar que, no geral, somos todos gente bastante normal, sem grandes filmes de alternativo/gothic/dark/morangos selvagens (Bergman, crianças, não Angélico & Cia.) que éramos nos anos 90. Se bem que amaremos sempre camisas de flanela, Sweats largueironas, Doc Martens e Eddie Vedder ganhámos o sentido de humor suficiente para nos rirmos de tudo, sobretudo de nós próprios.
Ainda ontem falava com a minha amiga Su a este respeito: é que parece que vivo numa bolha protectora, e cada vez que saio dela é um choque ao meu sistema. É verdade que tento sempre rodear-me de gente interessante, com quem aprendo sempre mas, minha nossa senhora de todas as graças, o mundo está cheio de gajas e gajas (e uns quantos gajos). Deixem-me explicar.
Não entendam gajas na acepção carinhosamente irónica dada às amigas, ou Doutoras no sentido igualmente irónico com que trato as colegas de trabalho de quem gosto bastante. É gajas mesmo, gajas no sentido de irritantes e chatas, cheias de importância santimónia, Doutoras sem ironia nenhuma, como se vivessem numa plataforma acima das restantes mortais. Querem-me explicar de onde saíu esta coleção de gajas pro-activas cheias de competências e de si mesmas? E expliquem-me lá, afinal que raio vem a ser isto de pro-activa? O que é que de errado há com
activa? Expliquem-me porque é pior ser activa (como os vulcões) e melhor ser pro-activa (como os iogurtes)? E o que é que tem de mal ter capacidades, ter habilitações, à antiga e efectiva, e o que é tão bom a respeito das competências? Ultimamente sinto-me assaltada por estas coisas, estas atitudes pôem-me doente. Sobretudo se acompanhadas como o bife pelas batatas fritas de mente limitada e tacanha, de falta de flexibilidade e de sentido de humor, de auto-crítica. Quando uma pessoa se sente e passa por brilhante por defeito é desmoralizador. Mais que isso, vergonhoso. A sério, protejam-se. O mundo está cheio de gajas (e de gajos), e nem sequer me parece que vão a lado nenhum, estão para ficar.



sábado, outubro 04, 2008

Paul Newman

Como se mede a grandeza de um Homem? Pelo dinheiro? Pelo sucesso? Na minha opinião mede-se pelas suas qualidades morais, nada mais, nada menos. O dinheiro que se ganhou ou herdou, os sucessos que se acumularam são apenas lupas que ampliam as qualidades ou defeitos, as fragilidades de uma pessoa. Pessoas egoístas e fracas apenas usam as coisas que têm para se esconder atrás delas, pessoas boas, verdadeiramente boas, usam o que têm, o muito ou o pouco, para deixar o mundo um lugar melhor que aquele que encontraram. É esse o verdadeiro traço comum de todos os grandes Homens, com H grande. E na minha modesta opinião, Paul Newman era um homem com H grande, uma das últimas grandes estrelas.
A fama é agora uma coisa relativamente fácil. Todos querem os seus 15 minutos, seja pelo que for. Diariamente nos entram pela casa herdeirazinhas fúteis, cujo único valor reside no apelido deixado por bisavós ricos, starletts de ambos os sexos quase orgulhosas dos seus vícios e auto-indulgências, mercadores da sua intimidade por mais uns minutos e exposição mediática. Paul Newman era um dos últimos de uma geração totalmente diferente, em que a fama era secundada por talento, verdadeiro talento, por orgulho e amor pela profissão que tinha. Foi mestre no seu trabalho, tendo participado em filmes tão importantes e significativos que daqui a umas centenas de anos o seu nome será ainda um dos grandes nomes da história da sétima arte, enquanto as autoproclamadas luminárias da sétima arte de agora serão, com muita sorte, notas de rodapé. Mas isto, apesar de muito significativo, não é aquilo que quero realçar.
Como já disse, o que torna um Homem (no sentido de representante da espécie humana e não no género) um Homem, é o ter deixado o mundo num melhor lugar que o que encontrou. Paul Newman é um desses homens. Fez caridade (no melhor sentido possível do termo) a vida inteira. Fundou, expandiu e ampliou uma empresa multimilionária cujo único objectivo era canalizar a totalidade dos lucros para causas meritórias, sobretudo para crianças desprotegidas ou doentes. A perda trágica de um filho para as drogas chamou-lhe a atenção para todos os outros meninos perdidos, e assim, através deles, lhe honrou a memória.
Mesmo que não tivesse sido uma grande Estrela ou um grande Filantropo, Paul Newman seria, ainda, um grande Homem, um Homem com qualidades morais que todos podemos ansiar a ter. Nem todos têm em si grandes talentos, nem todos podem ser filantropos na escala que ele o foi. Mas todos podem ansiar a manter a grandeza moral que ele demonstrou ao longo da vida. Porque acreditem, um homem que amou a mesma mulher cinquenta e tal anos teve, de certeza, uma enorme grandeza moral. Sobretudo quando teve escolhas, e a assombrosa beleza física de que era dono. Poderia ter sido muito mais promíscuo, muito mais inconstante, nunca o foi. A mulher com quem casou (não a primeira, mas a definitiva) nunca foi a radiante beleza que muitas das suas contemporâneas eram. E o casamento deles foi sempre uma rocha firme, um porto seguro. Vi uma entrevista dos dois, o ano passado, na qual se via, a olho nu, o respeito, o carinho, e sim, a paixão que duraram uma vida inteira.
Com os media a jogar sujo, como agora, quando alguém famoso morre rapidamente fazem um obituário relembrando todos os escândalos, todas as falhas. Os de Paul Newman não o faziam, pois tinha a admiração de todos, todos concordaram que tinha morrido um grande Homem, com H grande. E isso é uma bela súmula de oitenta e poucos anos de vida.