quarta-feira, maio 30, 2007

A síndrome não venhas tarde



Discutindo estas coisas de homens e mulheres, chamaram-me a atenção para um assunto interessante: por que motivo se punha tanto ênfase nos homens que são traídos, havendo uma miríade de expressões para isso e quase nenhuma para as mulheres. Teria de ser, como me disseram, uma prova de que as mulheres eram menos fiéis que os homens, tendo nós, como se sabe esta tendência para sermos falsas e dissimuladas, lol. Logicamente, este é um argumento falacioso.
O motivo para esta ausência de expressões pejorativas para mulheres traídas é muito simples: faz tanta parte do território que já ninguém repara. Não se esqueçam que, historicamente, um homem podia (não, devia) lavar a sua honra de homem traído com sangue, ou devolver a esposa traidora a casa dos pais como mercadoria defeituosa, enquanto uma mulher deveria esperar que o homem tivesse as aventuras porque era, simplesmente, uma coisa que os homens faziam, como desfazer a barba. Aliás, o dever de uma boa esposa, para além de lhes criar os filhos, limpar a casa e servir refeições quentes a horas era deixar o homem à solta para fazer o que queria, não fazendo perguntas. Se se lembram da cantiga não venhas tarde, a coisa está perfeitamente explicada:
"Não venhas tarde,
Dizes-me tu com carinho,
Sem nunca fazer alarde,
Do que me pedes baixinho.
Não venhas tarde,
E eu peço a Deus que no fim,
Teu coração ainda guarde,
Um pouco de amor por mim.

Tu sabes bem,
Que eu vou para outra mulher,
Que ela me prende também,
Que eu só faço o que ela quer.
Tu estás sentindo,
Que te minto e sou cobarde,
mas sabes dizer sorrindo,
meu amor , não venhas tarde.

Não venhas tarde,
Dizes-me sem azedume,
Quando o teu coração arde,
Na fogueira do ciúme.
Não venhas tarde,
Dizes-me tu da janela,
E eu venho sempre mais tarde,
Porque não sei fugir dela.

Tu sabes bem,
Que eu vou para outra mulher,
Que ela me prende também,
Que eu só faço o que ela quer.
Sem alegria,
Eu confesso tenho medo,
Que tu me digas um dia,
Meu amor, não venhas cedo.

Por ironia,
Pois nunca sei onde vais,
Que eu chegue cedo algum dia,
E que seja, tarde de mais."

Ou seja, ele trai a esposa com outra que acha irresistível e ela, como boa esposa, espera por ele, e sem se queixar. Vistas bem as coisas, ele é que é a vítima, o desgraçadinho que não consegue resistir aos seus instintos e tem, porque tem, de andar com outra(s), colocando em risco a relação com a mulher que ama, o que lhe causa ciúmes à possibilidade dela arranjar outro. A sorte é que ela não se queixa (porque ele está só a ser o que os homens são) e espera por ele, noite após noite. Com sorte, quando ele chegar,cansado de reboladelas vigorosas no feno com a amante, ela tem-lhe o lanchinho preparado, os chinelos e o banho pronto, como é a sua obrigação.
Admitindo que esta canção é antiga, e que a sociedade portuguesa mudou muitíssimo nas últimas décadas, não se iludam que esta atitude mudou especialmente, porque não mudou. Há uns anos, na cidade em que vivia, havia uma expressão muito típica, chamada namoro de bicicleta. Em que consistia? O namorado estava com a namorada todos os dias, até, digamos a sua meia-noite, uma, e depois ia levá-la (pôr a bicicleta a casa). Liberto que estava dos impedimentos da "oficial", e cumprido o dever de bom namorado, o dito sentia-se no direito de ir por esses bares e discotecas "divertir-se", ou seja, encontrar outras mulheres com quem tinha casos passageiros. Como cumpria com o seu dever de namorado, mesmo saindo noite após noite com outras, se ela o traísse ele seria, e muito bem, a parte ofendida.
A cultura masculina vive muito dessa descupabilização dos homens, pois não fazem mais nada seguir o seu instinto. A ideia ancestral de que o dever de um homem é is por aí "disseminar" a sua semente e garantir as gerações futuras desculpa-os da responsabilidade de fidelidade. O conceito só é uma coisa séria e obrigatória nas mulheres. Dizerem que, coitados, não são de ferro desculpabiliza-os dos votos que assumiram. Aliás, homem que seja fiel, que, tendo hipótese de traír e não trai, é considerado pelos amigos como um banana frouxo que não merece a sorte que tem. Á pergunta porque é que os homens traem as mulheres a resposta é simples: porque podem.
Quando uma mulher trai um homem ( há excepções, mas não muitas), já está com um pé fora da relação. Mais que casos inconsequentes, procura substituto. Os homens não encontram qualquer dificuldade em separar as águas, podendo estar profunda e devotamente apaixonados por uma mulher e, mesmo assim, traí-la com todo o seu círculo de amigas e parentes, caso tenham oportunidade para isso.
A culpa de os homens serem os traidores mentirosos que são, e a traição masculina ser menos grave que a feminina é, lamento dizê-lo, nossa. Os homens não traem as mulheres sozinhos, precisam de colaboradoras. Apesar de eles poderem ser mentirosos e falsos, escolhendo esconder esposas e namoradas, muitas de nós sabem que a pessoa com quem saem é comprometida e mesmo assim deixam-se andar. A culpa é da nossa mentalidade que dita que ter um homem, mesmo que seja de outra, é preferível a não ter nenhum, como se fossemos menos mulheres por estarmos sozinhas à espera da pessoa ideal em vez de andar com um qualquer só para evitar as noites solitárias. É nossa também por admitirmos e perdoarmos tantas vezes as quebras de voto deles, e perdoar traições uma e outra vez. Se a senhora do Não venhas tarde o esperasse com um taco de basebol, ou, menos violentamente, com as malas à porta e as fechaduras mudadas, eles pensariam duas vezes em fazer asneira. Talvez não se emendassem todos, mas pelo menos tinham muito mais cuidado para se deixar apanhar. E é nossa também por não fazermos como eles, tentando resgatar o que fica em vez de reverter a síndrome do não venhas tarde e pagar no mesmo troco.
Conhecem a anedota do recém casado que se vira para a esposa no fim da lua-de-mel e diz:
-Olha, agora que acabou a lua de mel, vou establecer regras: à segunda-feira à noite, é dia de cinema com os amigos e não fico em casa. Às terças e quintas à noite, ginásio. À quarta , bola com os amigos. À sexta, póquer. E sábado vou com eles para os copos. Compreendido?
Ela olha para ele com ar pensativo e passados trinta segundos responde:
-Ok, eu também quero impôr uma regra, posso?
O marido, contente por não haver objecções às suas exigências diz que sim.
-É assim- diz ela- nesta casa há sexo todos os dias. Quem está, está. Quem não está, estivesse.
Ah leoa!

7 comentários:

Anónimo disse...

Olha que disseram uma vez assim "Com a fruta assim pendurada de fora a gente tem que a arejar. Depois admiram-se de um homem não ser fiel. Olha, Fiel é o cão do meu vizinho". Confesso que na altura andava de palas como os burros e a moeda não me caíu até mais tarde. Na altura achei que fosse anedota. Afinal, não era.

Sempre

Su

bruxinha disse...

ah leoa!!

elisa disse...

Ahaha, que não está estivesse!!! é mesmo isso:)
Beijinhos

Carocha disse...

Excelente afirmação!

Anónimo disse...

Olá. Gostei da anedota e daquela de "esperar por ele com um taco de basebol"!LOL!
Ah leoa! (todas temos uma dentro de nós, ás vezes esquecemo-nos disso!)

Passionária disse...

Há aquelas de nós que gostam de perdoar. Já eu não sou grande coisa no perdoar essas coisas, no esquecer muito menos...
bom fim-de-semana a todas

Unknown disse...

Até se entende que eles tenham uma noite para eles. Mas eles pensarem que nós compreendamos que a saída seja para ir ter com outra, é demais. Será que homem pensa que ainda há mulher parva e cega?!
Hoje em dia, fala-se muito no aumento do nº de divórcios, que as mulheres de hoje não aguentam nada como antigamente. Ainda existem mulheres "martires", mas muitas não querem maus tratos e traições, para ainda sofrerem caladas.
A anedota é exemplo das mulheres que não se ficam e não aguentam tudo até ao fim em nome do casamento e sociedade.
Mais uma frota
miss ya as always
C.