terça-feira, maio 22, 2007

A moda explicada aos homens



Se não forem metrossexuais ou qualquer outro desvio cultural que os faça importar-se, os homens têm poucas considerações a ter em conta ao vestir-se. Olham à sua volta e pensam uma coisa na linha do está frio ou calor? A roupa está limpa? Serve? Então, siga. E ficam-se por aí.
Uma mulher, ao vestir-se nunca tem, nem se pode dar ao luxo de ter, só essas considerações. Para além da adequação à temperatura e ao asseio geral, muitas outras questões urge ter em conta. Dizer a uma mulher que a roupa que veste é apenas uma forma de protecção contra os elementos é o mesmo que dizer que a segunda guerra mundial foi uma pequena troca de argumentos entre mães no parque acreca de qual dos filhos teve dentinhos mais cedo.
A roupa, para nós, tem de obedecer aos mais diversos critérios. Primeiro, e antes de tudo, tem de ficar bem. E este ficar bem vai muito para lá do meramente servir no sentido de ser do nosso número. Vai ter de servir, como a artilharia, para defender os nossos pontos fracos, camuflá-los tanto quanto possível, pondo em evidência os nossos pontos fortes. E se leram o artigo do chazinho, sabem que para nós há sempre pelo menos uma boa dúzia de pontos fracos. Depois, vai ter de se adequar ao contexto, e não é só frio/ calor/chuva/vento. Vai ter de estar de acordo com coisas como, por exemplo, o sítio onde vamos, o nosso estado de espírito e o que pretendemos fazer nesse dia, a nossa idade (mental e física)... Num contexto de romance, por exemplo, escolher a roupa é uma coisa a ser encarada com a seriedade de uma campanha militar. Que imagem queremos transmitir? Acessível, natural e despreocupada, com os jeans e o top? Inocente e calma, com a camisa floral e a saia? Deusa sexy, com a saia e o top mais decotado? Rainha de gelo, com o fato preto? Desportiva e activa, com as calças de malha e o top de algodão? Conservadora, com a camisola sem decote e as calças clássicas? Profissional e competente, com o tailleur sóbrio? E isto sem falar dos acessórios. Sapatos altos ou baixos? Colares ou alfinetes? Malas de ombro ou de mão, grandes ou pequenas? Mais a maquilhagem e o cabelo. Tudo se conjuga num todo, pensado com precisão para um fim específico. E isto fazêmo-lo já de uma forma automática, sem demasiadas considerações filosóficas. Anos de treino levam-nos a fazer este cálculo mental de forma quase imediata. As coisas são simplesmente assim. E assim explicamos o ficar tão solenemente chateadas quando são sabemos onde vamos. Estraga-nos o esquema.
Mesmo que a roupa obedeça a todos os critérios acima, tem ainda de obedecer a mais um, talvez o mais importante: está ou não na moda? A moda, meus caros homens, é como o ar, está por todo lado e ninguém lhe escapa. As mulheres muito menos. Foi inventada por e para nós, para ocupar a nossa mente no tempo que, historicamente, não nos podiamos dedicar a muito mais, e ainda hoje nos absorve. Poucas de nós são anti-moda, e tal como na filosofia, rejeitá-la é já um fashion statement. Mesmo aquelas de nós que estão muitíssimo ocupadas com trabalho e filhos e marido e casa reparam, mesmo aquelas de nós que têm pouco dinheiro tentam obedecer-lhe. É inevitável. E mesmo que vocês, homens, não reparem, as outras reparam com certeza. E se há mais alguém para além das outras mulheres para nos fazer sentir mal-vestidas e fora de moda, eu de certeza não conheço. A não ser os gay virados para a moda, mas esses também são da equipa, claro.
A moda é uma forma de hierarquia entre as mulheres. Não se deixem ir na conversa que nos vestimos para nós mesmas (as que o fazem são raríssimas), ou para vocês, os homens que estão, ou gostaríamos que estivessem, nas nossas vidas. Isso é bluff. Nós vestimo-nos para as outras, e se não activamente para nos impôr como icones de moda, à defesa para não parecermos desleixadas e antiquadas por comparação. Há aquelas que, entre nós, estão sempre bem e que nos servem de modelos, aquelas que são idealmente magras e uniformemente elegantes (e, muito frequentemente, universalmente odiadas) e há aquelas de nós que tentam manter-se mais ou menos a par, ou pelo menos não se sentir totalmente desadequadas matronas sem graça.
Dizem que as mulheres verdadeiramente elegantes (não necessariamente magras nem novas) têm um estilo clássico e pessoal, vestindo o que lhes fica bem e pouco mais, sem ir em modas efémeras. Nós, as comuns mortais, vamos vagando entre onda e onda da moda tentando não nos afogar em tendências que são demasiado caras / extravagantes/juvenis/pouco adequadas ao nosso corpo, tentando ficar mais ou menos actuais. É praticamente uma luta inglória, pois poucas de nós têm tempo ou, mais importante, orçamento para um guarda roupa novo a cada seis meses, mas isso não nos impede de tentar. Noblesse oblige. Por isso, meus caros, a próxima vez que lhes apetecer desesperar por causa do tempo que nós demoramos a experimentar roupa numa loja, lembrem-se da tarefa hercúlea que temos pela frente. E tenham um pouquinho mais de paciência, sim?

3 comentários:

Unknown disse...

Numa tarde chuvosa, com um apetite imenso para trabalhar, dei por mim a navegar/surfar (apesar do tema surfista já ter tido direito a uma séria reflexão), e encontrei este blog com imenso requinte na análise feita à condição feminina e mais supérflua à condição masculina. A verdade, é que me canso de dizer às mulheres que conheço (poucas é certo, também sei os meus limites) que nem para elas são boas, arranjam sempre um defeito qualquer no corpo, no que vestem, no que fazem.
Parabéns pelo blog.
Fernando

Unknown disse...

Só mais um pequeno comentário, uma mulher bonita aos olhos de um homem fica sempre bem, mesmo com uns jeans e uma t-shirt! Reconheço porém que ver uma mulher vestida de forma elegante faz realçar ainda mais a sua sensualidade, mas acho que isso é porque ela se sente sensual e é essa confiança que nos atrai...

Passionária disse...

Uns jeans e uma t-shirt são opções de vestuário que não se compadecem com todos os tipos físicos. Algumas de nós ficam melhor com outras coisas. A palavra de ordem é camuflar defeitos, realçar qualidades. Quanto à análise masculina não me parece superficial, apenas um nadinha crua, mas verdadeira.
De qualquer maneira, obrigada pelo maior elogio que se pode fazer a quem escreve: lê-lo.
Vá aparecendo.