Pode-se dizer que sou uma estudiosa dos portadores do cromossoma Y há bem uns 25 anos. Precoce, eu sei, mas desde o dia em que reparei que o Esteban das misteriosas cidades do ouro era interessante que o fascínio não diminuiu. Quando muito, aumentou com os anos, tomando, como as mudanças dos Camões, sempre novas qualidades.
Acho que faz parte das nossas características genéticas esta tendência para a reflexão sobre os Y. A vida inteira os observamos, não com a abordagem fria e científica dos cientistas, mas antes com o interesse e as segundas intenções de um observador envolvido e apaixonado. Estou convencida que esta nossa capacidade de observação é uma ferramenta evolutiva fulcral. Precisamos de ser capazes de analisar acções e expressões sem a componente verbal envolvida, porque desta ferramenta depende a nossa sobrevivência: não só é vital interpretarmos as necessidades dos nossos filhos pequenos, quando não podem falar, como precisamos de de escolher um companheiro fiável para a criação dos respectivos.
Já do outro lado, os portadores do cromossoma Y têm outras características, outras ferramentas igualmente vitais para a sobrevivência, como a de se centrarem num ponto e serem directos e objectivos, mas a nossa de observação, nunca lhes notei.
Bloguista que sou interessada no que o outro lado diz, já li alguns blogs cujo enfoque é o mesmo que o meu, escritos por homens sobre mulheres. Mas devo confessar dos que li, mesmo bem escritos e interessantes, um de dois defeitos tinham: ou eram demasiado centrados numa só mulher, e não no género em geral, ou eram demasiado primários, superficiais. Não sei se isso tem a ver com a deficiente oxigenação do cérebro, posto que quando eles olham para nós o sangue tende a afluir-lhes para outras partes, se com características fisiológicas e genéticas que os impedem de nos observar e analisar com a mesma eficácia que nós o fazemos.
Disse a minha amiga Su, que em conversa com o falecido de uma amiga em comum, pode constatar que de facto eles não têm ideias muito realistas de como somos. Parte deve-se, como expliquei acima, a características físicas e genéticas, que explicam alguma coisa, mas não tudo, ou não existiria livre arbítrio. Mas não poderemos descartar a pesada influência da cultura em si. A imagem será sempre parcial e imperfeita, pelo motivo de não estarem predispostos e treinados para a observação detalhada, mas o maniqueísmo das representações masculinas das mulheres é igualmente condicionado pela cultura.
A cultura ocidental, aquela de que sei mais, porque é aquela onde me inscrevo tem, desde os finais do século XIX uma visão dual das mulheres, que permanece tão vital como a da representação do amor romântico sua contemporânea: as mulheres ou são amantes ou donas-de-casa, ou são coutrisaines ou ménagères, como diziam os defensores do naturalismo (e partindo das mesmas teorias de predisposição genética como eu neste texto). Não há, na cultura masculina, grande espaço para as gradações de cinzento que nos formam. Não conheço nenhuma mulher que seja puramente uma destas coisas, e olhem que por causa da minha profissão conheço muitas de todas as idades.
Poderemos culpar os cromossomas, poderemos culpar o Y onde em nós há X da falta de entendimento entre sexos? Das ideias fixas masculinas para quem somos ou cabras ou amorosas, ou santas ou vadias, ou ninfomaníacas ou puritanas sem espaço a meio? Não me parece. Influencia, mas não determina. Mas a verdade é que pretendo continuar a estudar o género pelo menos mais 25 anos, por tanto até lá pode ser que mude de ideias. Eu prometo que, como até aqui, me irei aplicar. Estudar sempre foi a minha coisa preferida.
2 comentários:
Nao me me vou por com hipoteses para orientar o estudo. E um tolice. Ha mais coisas entre os cromossomas xx e xy do que sonha a nossa filosofia. Mas, pitchku matrinu, tem tempo e recursos suficientes para escrever sobre futebol e filmes obscuros. Bem que podiam usar algum desse tempo- ou daquele que usam a contar azuleijos na casa de banho- para tentar entender melhor as mulheres.
jinhos
Su
Olá Passionária!
... sempre estudiosa, uma boa dose de clarividência...
Eu tenho estudado fortemente a matéria, possívelmente utilizando outros vectores de análise e até pelo natural estigma do género, a minha abordagem tem tentado ser relativista e abrangente. Penso que a matéria é, se não a mais importante para mim de todas as temáticas, uma das mais universalizantes de que me dei conta. Estou a escrever um livro que trata desde a biologia humana até à proteómica passando como é óbvio pela genómica e pela genética molecular, paralelamente à ciência a conclusividade implícita na história é digamos muito mais superficial e tangível sendo a dualidade mulher-mãe e mulher erótica o eixo de rotação dos necessários estudos e pesquisas, ficando a questão sociológica afectada pela análise política e filosófica.
Penso que vale a pena dedicar algum tempo a esta fundamental temática. Desejo-lhe por isso as maiores felicidades e energias disponíveis.
Francisco de Assis - Um escravo no século XXI
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