Hugh Laurie (is in da house...)
quarta-feira, janeiro 31, 2007
segunda-feira, janeiro 29, 2007
Big Boys Toys
Eu, pessoalmente, não sou especialmente gaja, no sentido de que aquilo que as mulheres costumam coleccionar ou fazer nos tempos livres não me entusiasma. Não gosto de miniaturas e bibelots, de coleccionar bonecas de porcelana ou fazer ponto cruz. Os peluches dão-me um bocado de alergia e o ponto cruz anda, no meu entender, a poucos passos da morte cerebral. A unica coisa mais galinácea que colecciono é, para uma certa vergonha minha, sapatos, mas mais porque os adoro que pelo desejo intenso de ter centenas de pares. Mas prontos, pelo menos compreendo o ponto de vista daquelas que se dão a essas coisas, é-me familiar. Quando o assunto são brinquedos de homens as coisas escapam da minha linha de compreenão para aquele território misterioso da mente masculina onde só nos sai um perplexo porquê, meu deus, porquê?
O motivo que leva um homem adulto a passar grande parte do seu tempo livre em jogos de estratégia em que faz de conta que anda perdido num subterrâneo cheio de dragões, ultrapassa-me. O motivo que leva um homem, sóbrio e fleumático de natureza, a correr a cidade inteira à procura da última xbox porque tinha acabado de sair e estava esgotada, ultrapassa-me. O motivo que leva um homem a seis meses do casamento a dar três mil euros por uma bicicleta de btt quando não tem sequer um sofá na casa do futuro casal, enche-me de perplexidade. O motivo porque um homem reformado dos seus dias de estroina colecciona carros antigos para poder mexer neles, gastando quatro vezes mais o que custou só para os pôr a andar e atulhar a casa, cozinha incluida, de peças oleosas e farrapos engordurados, vai muito para lá das minhas capacidades de imaginação. E olhem que não estou a exagerar, todos os exemplos que dei são perfeitamente legítimos e verídicos e aconteceram bem perto de mim a pessoas que gosto e respeito.
A geração dos nossos pais não era assim, não tinha esses hobbies. Não vinha com a conversa de que precisava do "tempo para ele". Quando muito, fechava-se no wc para ler o jornal desportivo sossegado. Nos tempos livres fazia coisas com os filhos, levava a família, a mala térmica e o cão à praia. Iam ver coisas. Agora não. Agora têm de ter os brinquedos deles. Brinquedos esses que são caros. Sim, porque homem que é homem não consegue afirmar a sua masculinidade se não se empenhar a sério no seu hobby. Não pode limitar-se a ir à pesca com uma cana qualquer, não, tem de ser a cana xpto mais os anzois xyz, como se as douradas fossem notar a diferença. Um homem não pode limitar-se a gostar do seu carro, não, tem de o aparelhar com tapetes em pura lã de lamas bebés tecidos à mão por virgens nepalesas. Ou de lhe pôr umas jantes de liga especial resistentes ao clima de mercúrio, na probabilidade de um dia lá ir, em vez de para casa, para o trabalho ou para o jumbo fazer as compras de sábado. Se a sua cena forem jogos de pc não pode andar a jogar o mesmo jogo, não, tem de comprar as versões todas, versões essas que saem de seis em seis meses.
Contou-me o meu cunhado, ele próprio adepto de btt e possuidor de milhentas mariquices dessa àrea, que a última moda são as corridas de carros telecomandados. Sim, para homens adultos. E não, não são daqueles dos putos que custam umas dezenas de euros. São daqueles que correm com gasolina de verdade e custam centenas.
Mas que é isto, será que a vida doméstica destes homens é enfadonha a ponto de se refugiarem no ridículo de corrridas de carros? Não creio. Parece-me isto apenas um sinal do síndrome de Peter Pan, os homens crescem, mas não amadurecem. Só os seus brinquedos ficam maiores. E mais caros.
Estava à conversa com um amigo meu, gajo de quatro costados, e ele perguntou-me: olha lá nós oas homens temos o futebol com os amigos e os hobbies, e vocês como gastam essse tempo? Com vocês, a casa e os filhos, respondi. Devo dizer que a conversa ficou por ali.
terça-feira, janeiro 23, 2007
Deusas, Musas e heroinas avulsas.
Este pode ser, sem qualquer problema, considerado o primeiro romance em que uma mulher é retratada de uma forma moderna, ou seja, sem cair facilmente na categoria ou de dona de casa ou de rameira, o que foi sempre uma tradição da literatura ocidental. E o mais engraçado é que foi escrito por um homem. É verdade que Gustave Flaubert sempre disse que Madame Bovary era ele, mas se calhar não estava errado de todo. Ao construir uma heroína que, de uma certa forma, pensa como um homem, está a admitir uma verdade óbvia: que não há diferenças óbvias entre o funcionamento mental das mulheres e dos homens, desde que seja dado ao sujeito uma certa liberdade para as escolhas dos seus próprios caminhos sem grandes restrições de meio.
O instinto maternal, ou aquilo que os homens consideram a tendência natural das mulheres para serem mais castas, mais "morais", se quiserem são ideias inerentes mais do meio que de uma pré-formatação inata ao sexo feminino. Dadas as condições ideais, nós, mulheres, podemos ser tão insatisfeitas como os homens em termos de romance, vagando de braços para braços. E sem mais dilemas morais que os da insatisfação do amor que promete mais que cumpre, forçando-nos sempre à busca de um amor melhor mais perfeito. Podemos considerar, se nos der para tal, que a Madame Bovary é uma espécie de D. Juan feminina, e apesar de não ter os números estrondosos de amantes do original, tem em comum com ele a mesma malaise d'être que a impele sempre em busca do amor a qualquer preço.
Claro que todas as histórias podem ser vistas de duas perspectivas diferentes, e esta Madame Bovary pode ser vista como o epítome da hiper-feminilidade, uma mulher mimada e caprichosa, educada para ser indolente na sua existência de burguesa, que leva a vida a sonhar com roupa nova e estilo, um estilo de vida chique e sofisticado muito longe daquilo que o marido, médico de província, lhe pode dar. Os amantes, como as roupas são apenas mas um acessório para o estilo, sempre insatisfatórios, sempre pífios, reles para o que ela espera deles.
Eu acho, e olhem que é a minha opinião, que a grande tragédia da vida dela é o nunca chegar a ser amada, amada como quer e precisa. É amada inadequadamente pelo marido, demasiado absorto, demasiado frágil, demasiado moldável, que a ama e não a compreende. Não é amada pelos amantes, apenas desejada, usada como uma coisa de prazer. Não sei se o desejo dela seria ser amada como igual, noção perfeitamente radical para o século XIX como o ainda é agora no século XXI. Talvez fosse essa a solução para ela. Ou talvez encontrar uma ocupação menos fútil que a de encontrar o chique de uma toilette nova. É dificil ver as coisas assim, a esta distância, e não fazer os juizos de valor fruto da minha educação laica e feminista. Mas a única coisa que retiro deste livro é um sentimento imenso de tristeza, que tristeza de existência vazia a dela, que desperdício...
Fazendo parte da escola realista, Flaubert pretendeu, com este livro, fazer uma espécie de ensaio vivo sobre a educação das mulheres, de como a ociosidade burguesa que tratava as mulheres como bibelots gerava todos os vícios e mais alguns. Em meu entender conseguiu mais que isso, conseguiu um estudo na natureza humana, na insatisfação que nos leva a fazer aquilo que nem nós entendemos, que nos leva a querer, para lá da razão, muito mais que iremos conseguir...
quarta-feira, janeiro 17, 2007
The golden days
Ás vezes invade-nos assim esta sensação de que tudo estará bem, ou que pelo menos tudo ficará melhor. Vemos assim as nossas amigas, as nossas irmãs de coração partirem, ou melhor, partirem não, irem em direcção a coisas novas e inesperadas e sabemos o quanto lutaram pela felicidade, sabemos então que tudo ficará bem. Não por causa do que não temos, mas por causa do que elas conseguiram, é essência da amizade desejar-lhes bem, o melhor.
Por todas as horas partilhadas, por todas as dores de coração, por todos os risos, por todas as conversas, até por todas as brigas, obrigada. Podemos ser uma espécie desconfiada, mas quando temos amigas, amigas a sério como as minhas, estamos um pouco menos sozinhas.
sexta-feira, janeiro 12, 2007
terça-feira, janeiro 09, 2007
Pelo Sim
É impressão minha, ou a campanha do não ouve-se mais que a do sim ultimamente? Tudo o que é gente vem a praça pública defender o não, cita-se Fernando Pessoa,que o melhor do mundo são as crianças, mostram-se fotografias fofinhas de bebés. Depois disso a campanha do sim parece cinzenta, apagada, vergonhosa, como se se estivesse a fazer uma campanha pelo sim aos sacrificios humanos aos deuses. Um bando de desavergonhadas abortadeiras a defender o indefensável.
Não é fácil defender o sim, o não é mais fofinho, mais sentimental. Parece melhor. O interesse das crianças primeiro, claro, a preciosidade, o milagre que é um bebé. Mas alguém tem de ver as coisas pelo outro lado, alguém tem de cortar todo este veu de sentimentalidade bacoca e perceber a realidade como ela é: nem todas as mulheres dão boas mães, nem todas as épocas da vida são boas para ter um filho.
Sou pelo sim, não porque não gosto de crianças, mas porque as adoro, e porque lhes reconheço o direito de serem desejadas, de serem queridas e amadas por pais conscientes e responsáveis. Gosto tanto de crianças que lhes desejo o melhor, os melhores pais, as melhores condições. Não uma mãe adolescente, ela própria a precisar de uma mãe. Não uma mãe indiferente que negligenciará o filho, que já tem muitos e não quer ter mais, não uma mãe que odeia o bebé porque nunca desejou tê-lo.
Já viram as fotos de um aborto?Eu já. É chocante e doloroso vê-las. Não é nada de remotamente tão fofinho como o dos bebés vivos e sorridentes. Não acredito que nenhuma mulher recorra ao aborto senão em circunstâncias desesperadas, onde não há mesmo outra opção. E aquela que abortou guarda consigo a memória do horror que foi, do que se viu obrigada a fazer. As mulheres que optam pelo aborto não são monstros. Atrás de cada aborto há quase sempre (e eu sei bem que há excepções) um drama, muita dor e desespero antes do passo final.
De qualquer maneira não consigo suportar a hipocrisia das mulheres que dizem que não abortam e adoram crianças e recorreriam a ele se a filhinha adolescente estivesse grávida. Ou a vergonha que é defender o não e negligenciar os filhos que se tem.
Não, não é nada fácil defender o sim se nos chamarem egoistas por escolher, monstros sem coração. Ah, mas ter um filho é um passo tão grande, um milagre tão grande que é preciso ter maturidade para nos comprometermos a tê-lo, é preciso condições psicológicas e materiais para que o bebé seja bem tratado e não lhe falte nada. E é preciso perceber, e isto é uma verdade imutável, que há mulheres que não têm vocação para mães, simplesmente, e que terem filhos seria um erro pago pelos bebés e não pelas mães.
É óbvio que não defendo o sim como método anticonceptivo, ninguém no seu são juizo o fará. É óbvio também que acho muito bem toda e qualquer medida de apoio à família e a mães adolescentes. Uma coisa não deve excluir a outra, não faz sentido.
Para mim, de acordo com as minhas convicções, a lei não precisaria de ser mudada. Não me estou a ver abortar em circunstâncias que não as já previstas na lei. MAS, e este mas é essencial, não acho que deva impôr a minha moralidade ou convições pessoais aos outros. Sim pela escolha
às mulheres.
às mulheres.
quarta-feira, janeiro 03, 2007
Deusas, heroinas e avulsos
Há qualquer coisa de estranho e mágico neste livro que nos prende e nos fascina, não nos deixa poisá-lo por mais que queiramos. Não é um livro curto, nem fácil, nem cheio de glamour. E no entanto, qualquer coisa na história desta professora pobre, baixinha e não especialmente bonita nos fascina e comove até às lágrimas. Pelo menos comigo sempre o fez.
Este livro é uma espécie de bildungsroman, ou seja, começa na infância da protagonista e avança até à idade adulta, mostrando como se formou o seu carácter até ali. Qualquer mulher com pouca auto-confiança (ou seja, todas) conseguem identificar-se com aquela criança pouco amada, aquela mulher determinada, mas limitada pelas suas circunstâncias. E qualquer mulher com sangue nas veias se vai sentir irremediavelmente atraída pelo misterioso, ácido, irónico Mr. Rochester.
A Jane Eyre tem, minhas amigas, e isso torna o livro irresistível, um arquétipo masculino intemporal: o homem torturado.
Nenhuma mulher consegue resistir a um homem torturado, nenhuma. Ou só muito raramente. Tal como os filhos-da-mãe ou os indisponíveis, os homens torturados libertam uma vibração especial que ecoa dentro da perceptora vitoriana que há em nós (e eu gosto e valorizo muito a minha) e nos faz querer tratar deles e fazer com que tudo fique bem com eles. Ah, minhas amigas, é irresistivel, superior às nossas forças. Queremos curá-los do que quer que seja que na vida os tornou amargos e agrestes, difíceis, ignorando a verdade básica que muitos homens (e mulheres, claro) são simplesmente difíceis e mal-educados sem que nenhum trauma os tenha tornado assim, e que muitos seres torturados estão muito para lá daquilo que podemos fazer e precisam mais de um psiquiatra que de uma mulher que os redima (vão por mim, que sou diplomada no género).
Outra das coisas que torna este livro irresistível e muitissimo romântico, é a forma arrebatada com que ela é amada, aquela coisa feroz e sem limites que leva tudo à frente, até a lei e a moralidade. Que mulher não está farta de coisas assim-assim, do não sei muito bem se te amo, do vamos dar um tempo, do gostas mais de mim que eu de ti? Que mulher não sonha ser a primeira escolha no amor, a única possível, aquela que deixa marcas indeléveis (há entre nós, dirá Rochester, um fio invisivel que nos prende, não te afastes muito de mim ou arrancas-me o coração)?
A mulher insegura que há dentro de nós, a perceptora vitoriana mal-amada que há em nós, procura alguém como este Mr. Rochester, alguém firme e sólido como uma rocha, que saiba o que quer, ou melhor, que nos quer, e muito. É aquele nosso lado vulnerável que espera que nos salvem.
Uma das minhas melhores amigas diz que ela e eu (e os restantes membros do grupo) estão envenenadas pelas leituras de romances vitorianos na adolescência como este Jane Eyre, e que deviam trazer na capa a caveirinha que os venenos têm no frasco. Não deixa de ter razão. Não é lá muito liberado esperar que nos salvem, que nos amem arrebatadamente e nos valorizem. Não é moderno (é até um bocado embaraçoso) ter dentro de nós uma perceptora vitoriana a ansiar coisas, ou a querer salvar alguém. Mas as almas inseguras que há em nós anseiam e suspiram, mesmo se depois ingoram o suspiro com o cinismo próprio de quem vive no mundo real.
A ler, por vossa conta e risco.
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