segunda-feira, julho 17, 2006

Tachos


Para o homem médio a casa é constituida pelo triangulo das bermudas constituído por sala -quarto - casa de banho. Quando estão por casa por ali conduzem alegremente a sua vida natural. A cozinha é um território agreste e por explorar, aventurando-se eles pouco para lá dos limites dos mundos conhecidos que vão do eixo frigorifico-micro-ondas até ao caixote do lixo. Para mim que gosto de ser dona e déspota da minha cozinha tudo bem, mas muitas mulheres há que desesperam por causa disso.
Toda a gente sabe que a maioria dos homens não cozinha, a não ser que seja no fogo das brasas. Cozinhar nas brasas, fazer churrasco, tem qualquer coisa de primitivo e de original. Um homem que faça um grelhado sente-se como se acabasse de ter caçado o bicho com as suas próprias mãos, alimentando a namorada ou esposa com o suor do seu próprio rosto (yuck). Depois deste momento primitivo de cozinha o homem médio proclamaria: não estás contente, querida? Hoje cozinhei eu... cego ao facto de ter sido ela a fazer a salada, trazer as bebidas, temperar a carne, recolher os pratos e lavar a loiça, o que é um grande descanso, lol.
Depois dos grandes cozinheiros ao ar livre, temos os petisqueiros. Os petisqueiros são aqueles para quem a cozinha não lhes é alheia de todo. Têm um prato que é a sua especialidade e de que estão orgulhosos até às lágrimas. Se o fizerem para os amigos dizem: estão a ver, fui eu que fiz, hein? Fui eu... Entretanto, toda a santa louça da cozinha está fora e suja e dá uma trabalheira doida voltar a arrumar tudo. É óbvio que vão ficar ridiculamente orgulhosos do seu prato e se tivermos o azar de a "especialidade" sair bem, vamos ouvir peneirentamente que os melhores cozinheiros do mundo são homens e não mulheres. De 365 dias do ano eles cozinham um e isso já demonstra a sua superioridade técnica sobre quem cozinha o resto do tempo. Há que ser bom.
Encaremos a verdade: para cozinhar não é preciso ser um génio. Não é precisa a mesma perícia técnica de um neurocirurgião ou de um CSI. Qualquer idiota consegue cozinhar decentemente. Talento e perícia dão aquele toque especial, mas qualquer um deverá ser capaz de fritar um bife ou fazer um arroz branco. Nisto, as mulheres não têm qualquer grandeza moral pelas suas capacidades. Por isso, se os homens continuam a ser estranhos aos tachos e às suas utilidades a culpa pode ser atirada para um´só género: as mulheres, que lhes permitem esse afastamento.
Na minha geração, ainda havia uma diferença muito grande na educação das meninas e dos meninos, nomeadamente enquanto eles viam o Verão Azul ou o Dartacão nós ajudávamos a pôr as mesa, a descascar batatas e a lavar a louça. Como consequência ficou arreigado na nossa mente, por mais feministas que fossemos, que a cozinha era essencialmente uma tarefa nossa e não deles. Como os nossos pais antes deles, também aprenderam a cozinhar a arte do petisco e do grelhado, pois tudo o resto era um insulto à sua virilidade. Macho que é macho não faz ideia da diferença entre uma forma de Charlotte e um ralador e ponto final. Isto implica muito mais trabalho que o que seria justo e igual para as mulheres só para eles não porem em dúvida os seus frágeis egos e a sua masculinidade. Não são flores de estufa que murchem com o uso das colheres de pau.
Mulheres, não permitam desculpas dos homens. Não permitam serem subornadas com jantares fora ou pizzas cada vez que é a vez deles cozinharem. Insistam. Lembrem-se do trabalho que dá cozer um ovo. Se acham que o vosso namorado ou marido não consegue dominar a técnica de o cozer troquem-no por outro, pois qualquer coisa de muito errada se passa com as suas capacidades cognitivas. Digam não ao grelhado e ao petisco, digam não à cozinha de pantanas de cada vez que ele cozinha. Se, como eu, não conseguirem abdicar do comando do fogão, usem-nos como ajudantes. Homem meu não ficaria menos homem por ajudar a cortar legumes ou sacar do fairy e do esfregão verde.

7 comentários:

Anónimo disse...

cortar legumes?????????????

mas como? como se faz isso????

:)

lsd

Elisa disse...

bem... eu gosto deste blog, ai gosto mesmo. Estas pequenas lições são geniais.

Passionária disse...

Aparentemente, LSD, pega-se numa faca e exerce-se pressão sobre o dito legume até conseguir destacar uma pequena porção do mesmo. Sei que a explicação parece complicada, mas vá tentando que com a prática chega lá...

Passionária disse...

Obrigada, Lizzie, é saber de experiência feito...

Anónimo disse...

Passionária:
certamente percebeu, pelo meu comment, que sou estúpido em excesso, talvez mesmo por defeito.

porém, correndo o risco de desiludi-la ainda mais, dir-lhe-ei que as questões da cozinha ultrapassam, em mim, o território da estupidez – entram já no domínio dos grandes mistérios.

anyway, tendo noção de objectos como “faca” e “legume” e de acções como “exercer pressão sobre” e “destacar pequena porção de”, prometo tentar conjugar tudo isso de um modo tão competente quanto me for possível.

e, creia, só vou fazer este esforço para agradecer a amabilidade da sua explicação.

PS
o facto de ter começado o seu comment com um estranho “aparentemente” deixa-me algo desconfiado. passionária, por favor, espero que não estivesse só a gozar comigo...?!!?

:))

lsd

Passionária disse...

Eu, gozar consigo, LSD? Nunca. Para mim a ironia é só uma técnica de passar a ferro... Pode contar sempre comigo para lhe esclarecer estas pequenas dúvidas, esteja à vontade.

Anónimo disse...

Ainda bem que a sua ironia “é só uma técnica de passar a ferro”.
Sabê-lo-á melhor que eu: a ironia pode ser também maldadezinha.
Fico tranquilo.

Agradeço ainda a sua disponibilidade para me esclarecer “pequenas dúvidas”. Em todo o caso, não sei passar a ferro e irrita-me a eventualidade de poder maçar as pessoas. Além do mais, a sua escrita escorreita terá certamente melhores aplicações do que, simplesmente, esclarecer “pequenas dúvidas” de um palerminha.

Termino com uma frase rebuscada. Ensinaram-ma um dia destes e até me foi difícil decorá-la porque está num inglês muito complexo:
“- Bye!”

lsd

:))