quarta-feira, abril 28, 2010

Adeus ó melga

Não é que eu ande activamente à procura de motivos para dizer que os homens são exactamente aquilo que sempre acreditei que eram, de modo nenhum. Sou uma criatura optimista e acredito, no geral, na humanidade. Há boas pessoas, há más pessoas, há de tudo. Claro que depois acontece algo que me elimina o bom humor e o optimismo e sou obrigada a voltar à minha ideia original: os homens, no geral, não valem o chão que pisam.
O mais recente episódio nesta saga tem a ver com o ter encontrado na Internet uma notícia gira e curiosa: um site oferecia-se para acabar as relações em vez dos homens. Mais, por uma soma adicional poderia ainda gozar ou humilhar a desgraçada, era só preencher o campo próprio com as fraquezas e falhanços da mulher, que o resto estava feito. Isto apresentaria uma vantagem na medida em que muitos homens não são capazes de gozar com a ex-namorada como o fazem à frente dos amigos, com a mania que elas têm de chorar e ficar perturbadas quando levam com os pés e assim...
Eu já acho que os homens que acabam por carta, telefone, SMS, facebook ou até mesmo Twitter (os mesmos 150 caracteres das SMS, humilhação adicional) a escumalha da terra. Agora acabar com alguém por interposta pessoa não tem qualquer tipo de justificação moral. Não merecerá alguém com quem partilhámos o nosso corpo e intimidade um bocadinho mais de respeito? Aparentemente não.
Os homens que conheço e de que tenho notícia são uns cobardes. Detestam cenas, lágrimas e ranger de dentes. Não percebem o motivo de tanta emoção e psicose. Se o amor (se era amor que sentiam) acabou, porque não havemos nós de aceitar? Mais, porque haveremos nós de ser desagradáveis e dizer-lhe coisas ásperas quando eles foram honestos e fiéis à sua natureza? Ficam perplexos com a nossa dor, a nossa raiva, a nossa angústia. Daí a preferir uma maneira onde não sejam obrigados a levar com essas coisas irritantes que são as nossas emoções é um passinho de formiga.
No meu entender, é OBRIGAÇÃO deles ouvir-nos. Se eles nos aturaram durante a relação (e não foi isso tão magnânimo da parte deles?), nós não aturámos menos: aturámos inseguranças e acessos de ciúmes, frieza e indisponibilidade emocional, pequenas e grandes traições. Não mereceremos nós que nos ouçam, que possamos expor aos culpados as consequências dos seus actos? Amores, não existem almoços grátis. Não se entra nem se sai da vida das pessoas sem consequências, sem deixar rasto. Se esse rasto foi negativo, enfim, temos pena, mas têm de ser homenzinhos e aceitar as consequências. Se essas forem ouvir umas quantas coisas desagradáveis, ou verdades, como nós as mulheres gostamos de lhe chamar, azar. Cada um tem aquilo que merece. E para nós é essencial este confronto, é catártico. Sem um ponto final onde fica tudo dito, quando há margem para dúvidas esta dor e esta raiva infectam e envenenam-nos, não conseguindo ultrapassar ou demorando horrores a superar a relação terminada. Um corte rápido e definitivo dói menos, acreditem...
Claro que os homens provocam eles mesmos estes episódios. Já disse mil vezes, e torno a dizê-lo aqui, que a vida seria um sítio muito melhor se os homens fossem fiéis à sua natureza e absolutamente honestos. Se não criassem falsas expectativas com as suas palavras e acções, traçando planos para o futuro, dando nomes aos nossos potenciais netinhos, dando a entender que o desejo é mais que isso, não o sendo. Se assim agirem, sem mentiras, sem dourar a pílula, evitam criar em nós as expectativas que criamos, diminuindo para zero os episódios "psicóticos", que é como eles denominam a altura em que percebemos que fomos (literalmente) comidas por lorpas. Isto acontece porque, na verdade eles são cobardes e inseguros, passivo-agressivos com a mania que são gente crescida e detestam passar por maus da fita. Mas a verdade continua a ser que quem não quer ser lobo, não lhe veste a pele.
Por isso, se pudesse dizer algo aos homens a este respeito, seria qualquer coisa como, sejam crescidinhos a este respeito e tratem-nos como pessoas. Façam por nos dar a hipótese de não ficar nada por dizer. Vai ser complicado? Vai. Vão sentir-se malzinho? Provavelmente. Mas é inevitável e necessário. Não juntem o insulto à injúria recorrendo à tecnologia para nos dar com os pés, sim? Obrigada.

segunda-feira, abril 19, 2010

Mr. Right Now



Quando a minha professora de Filosofia, Maria Manuel falou acerca das etapas de desenvolvimento das crianças e referiu e o último era atingido em diferentes graus, e às vezes quase nem o era é que se cimentou em mim a certeza de que o mundo era definitivamente injusto. Quer dizer, já outras coisas, como o facto de os meninos poderem fazer chichi de pé e as meninas não me tinha feito desconfiar, mas esta era a primeira prova concreta que o mundo não tinha sido feito para ser igual. Era biologicamente injusto, cognitivamente injusto, anatomicamente injusto. Nem sequer era uma questão de mentalidades e de sociedade que, com o tempo, pudessem ser alteradas. Não, era injusto até ao nível microscópico, até à célula e à informação constante no seu núcleo e sobre a qual não tínhamos controlo.
Este pensamento deprimente só foi confirmado por outros conhecimentos. A geografia ensinou-me que até para nascer havia a regra de ouro do imobiliário: location, location, location. 5o km para a frente ou para trás e já a coisa corria mal. A matemática esinou-me a maldição a estatística: todas as estatísticas estão basicamente contra a gente, sobretudo as da população. Somos seis biliões de almas no terceiro calhau a contar do sol e no geral, podemos esperar que as coisas correm mal. A literatura e a história foram outro balde de água fria: as relações humanas são frágeis e vazias e a vida humana não dura mais que um segundo ( obrigadinha por essa, Vergílio Ferreira).
Todo este manancial de informação acerca das injustiças da vida veio confirmar duas coisas: não só, como diz a lei de Murphy, o que pode correr mal, corre, como ser feliz é basicamente uma possibilidade remota.
Na infância vendem-nos histórias com finais felizes, na adolescência, e depois mais ainda na vida adulta levamos com o balde de água fria da realidade: life sucks. Claro que há excepções, mas neste contexto temos de encarar a verdade: em seis biliões (e picos) de alminhas, como vamos nós encontrar o Mr. Right?
Esta coisa do Sr. Certo sempre me despertou algum cepticismo: mesmo que exista, como é que isto funciona? Vamos que o nosso Sr. Certo vive, por exemplo, numa remota aldeia da Noruega, da Tanzânia, da Nova Zelândia, do Peru. Conspirará o cosmos para nos juntar? Haverá a garantia cósmica de que está na nossa área geográfica e cultural? Fará parte das regras cósmicas ser da nossa cultura, ou da nossa cor, ou do nosso estrato social ou qualquer outra característica que achemos absolutamente indispensável para amar? Não sei se estão a ver que num universo tão injusto me parece que a vida vir com garantias é utopia, e regras dessas tão estritas ainda o são mais.
Neste contexto uma rapariga tem de se perguntar: valerá a pena esperar por ele? Será o Senhor perfeito como a linha do horizonte, uma utopia? Não será melhor olhar à nossa volta e ver o que há, aceitando o facto de o mundo ser essencialmente feito de compromissos e impossibilidades estatísticas? Os meus sentimentos são ambíguos em relação a isto.
Tento conduzir a minha vida de forma realista e pragmática. Aquilo que, no geral, me torna naquilo a que a minha mãe me chama de Nossa Senhora dos Aflitos é esta minha tendência de olhar para a vida sem grandes floreados, mantendo-me (muitas vezes, mas não todas, e quando falho é de forma espectacular) racional e analítica. Por esse motivo aceito e compreendo que esta coisa do Sr. Certo é uma conspiração de Hollywood para vender mais bilhetes ( senão comparem a base de fãs do Bergman com a das comédias românticas da Meg Ryan e depois digam-me qualquer coisinha). Mas optar pelo Sr. Já que aí estás, serves, ou pelo Sr. Para quem é bacalhau basta, ou pelo Sr. Tudo menos ficar sozinha parece-me uma perspectiva deprimente. Dizia o Pessoa que sem o sonho nada mais somos que cadáveres adiados que procriam. Deveremos abdicar do sonho do Mr. Perfect? Pois não sei.
Aquilo que me parece, da minha experiência, é que NIM. A única vez que tive uma relação baseada nesse pragmatismo, de que a vida é injusta e estamos todos abraçados contra a morte ( obrigada por essa, Alexandre O'Neill) a coisa foi um bocado catastrófica. A malta admirava-se e respeitava-se mutuamente, mas faltava ali qualquer ingrediente essencial para fazer o casal mais que a soma simples das partes. Também é verdade que era muito nova e impressionável e por isso os resultados dessa experiência podem não ser cientificamente válidos. Isto para já não falar que cada caso é um caso.
Assim sendo, o que fazer a este respeito de esperar o Sr. Perfeito ou olhar melhor para o Sr. Estou por aqui agora? Manter o espírito aberto, suponho.

terça-feira, abril 13, 2010

A natureza do escorpião

Não há muita gente que perceba porque motivo é este um dos filmes da minha vida. No geral não o refiro, guardando para mim a preferência. Já sou mal compreendida que chegue por aí para não alimentar mais bocas de como sou esquisita. Mas na realidade este Crying game ecoa mesmo com qualquer coisa de muito intimo, de muito pessoal, ecoa com aquilo que acredito sobre a vida e a natureza do amor.
Todo o filme se desenvolve à volta da fábula do sapo e do escorpião, sendo que o escorpião pede a um sapo para o levar até ao outro lado do rio. O sapo está renitente, mas o escorpião promete não o picar. Começam a atravessar o rio e o escorpião pica o sapo. Quando o sapo pergunta ao escorpião porque o picou, condenando os dois a uma morte certa este responde que não o conseguiu evitar, que está na sua natureza. O uso desta fábula não é inocente, serve um pouco a função que os coros tinham nas peças gregas e romanas. O comentário que sublinha a tragédia, o aviso e o lamento pela incapacidade das personagens fugirem das suas naturezas e, por conseguinte, dos seus destinos.
Se não acredito particularmente no destino, acredito incondicionalmente nos seres humanos seguirem as suas naturezas. Nunca duvidei e as pessoas estarem onde querem, como querem, com quem querem. Até um certo ponto as pessoas seguirão sempre as suas compulsões sem interferência da razão. A existir, esta servirá apenas para justificar as nossas escolhas, para arranjar uma desculpa racional para os nossos actos de crueldade, ou de egoísmo, de insensibilidade.
Não nascemos cruéis por natureza, mas as nossas experiências primordiais, os nossos traumas e cicatrizes condicionarão mais tarde a maneira como vivemos, a maneira como amamos. Marcará igualmente o nosso nível de entrega e o nosso nível de incapacidade de amar. A nossa natureza, moldada pelas nossas vivências condicionará irremediavelmente aquilo que vivermos no futuro, mesmo que isso nos condene a amores que são becos sem saída, e à nossa própria infelicidade. Não é o destino mas sim os nossos comportamentos passados que condicionam os nossos comportamentos futuros e que nos conduzem, a maioria das vezes, à tragédia.
Eu, como o filme, não acredito em grandes barreiras para o amor e, tal como a protagonista, me condiciono ao meu destino. Nem toda a gente consegue-ou quer- deixar de lado barreiras que aparentemente fazem sentido. Concedo que a barreira que separa os protagonistas e causa tanto pathos é mais difícil de ultrapassar que outras, mas motivos aparentemente fúteis são os proverbiais grãos de açúcar das formigas: pequenos numa perspectiva, gigantes por outra.
O motivo porque o jogo de lágrimas é o jogo de lágrimas, porque há sofrimento e infelicidade e não conseguimos deixar de nos condenar ao sofrimento é esta trágica incapacidade de vermos ou sermos mais que a nossa natureza. E que esta, raramente, senão nunca mudará.


terça-feira, abril 06, 2010

E pudesse eu pagar de outra forma...


Há muitas maneiras de curar um coração partido. Gosto de me considerar uma conaisseuse delas, pois com o meu historial de amores gosto de pensar que já as experimentei a todas pelo menos uma vez.
Há os clássicos, como uma noite de copos ou boiões de Haagen-Daz, a confortarem-nos a alminha. Há a choraminguice. Há casos de quem se encerre em casa com a Jane Austen em formato de livro ou de filme ou até série, é irrelevante. Há quem parta coisas, quem compre coisas, quem corte o cabelo (o que não é particularmente boa ideia, pois as ideias não estão claras e as nossas escolhas de corte e cor costumam ser trágicas). Há quem tenha flings de ressaca curando o coração partido com sexo do bom. Há quem se encharque em comprimidos, há quem escreva cartas, há quem escreva um romance. Seja qual seja a estratégia, no primeiro impacto queremos apenas procurar conforto e validação, algo que nos confirme como amáveis, como desejáveis, algo que restaure a nossa fé na humanidade.
Claro que uma vez passado este primeiro impacto, depois de deixarmos de metaforicamente ganir como cachorrinhos de golden retriever pontapeados, passamos à fase seguinte, à da raiva. E esta nem sempre ultrapassamos.
Por mais voltinhas que dê o mundo e as coisas evoluam, por mais feminista igualitária de cartãozinho passado e tudo que seja, não consigo ficar amiga de alguém que me esfrangalhou o coração, nunca consegui até hoje, não me estou a ver conseguir no futuro.
A partir do momento em que me pisoteiam o coração a coisa morre logo ali, nunca mais vejo o desgraçado com os mesmos olhos. Mas também, como poderia? Eu sou rapariga para Blimundas e Baltazares, levo o amor e a lealdade numa relação muito a sério. Se alguém prefere deixar-me por outra, deixar-me para ficar sozinha (pior) ou não me considera sequer digna para integrar a dream team do rol de namoradas do dito fico ( piada à gato fedorento em 3...2...1...) chateada, é claro que fico chateada.
Numa situação destas eu não digo que fico vingativa e desejo activamente que seja atropelado por um touro fugitivo como os parvos do San Fermin, mas um surto de, digamos, varicela, diarreia ou furúnculos em sítios embaraçosos e, de preferência, dolorosos seria, na minha óptica, um toque de classe kármico.
Quando ouço relatos de gente que acaba e ficam muitamigos, muitamigos, muitamigos, fico desconfiada e a olhar de lado: mas como é que conseguem. Eu cá por mim sou como os Ornatos: pago a conta em raiva. E pudesse, como eles dizem, pagá-la eu de outra forma...