segunda-feira, junho 11, 2007

É como ver um acidente acontecer


Minhas queridas, a não ser que o vosso mais-que-tudo tenha sido criado num mosteiro tibetano por monges budistas octogenários e, do mosteiro, tenha vindo directo para as vossas mãos, é natural que vocês não sejam a primeira mulher da vida deles. Eles, por mais que nos custe, têm uma HISTÓRIA, e não há nada a fazer, tal como vocês têm a vossa.
Costumo achar que, em casal, falar do passado é como viver um acidente de trânsito: por mais leve que seja há sempre horas de chatice depois e as coisas nunca mais serão as mesmas. Saber que aquele(a) que nós amamos já amou antes é um duro golpe. Preferíamos que tivesse vivido na mais abjecta solidão ou num desfiar de relações superficiais umas atrás das outras a ter estado envolvido- apaixonado a sério - por outra que não nós. E claro, como somos seres sensatos e maduros que somos, uma vez que se toca no assunto, queremos saber tudo: datas, nomes, pormenores, toda a verdade escabrosa da traição involuntária do passado. E depois sofrer, amuar, e sentir-nos inferiorizadas. É mesmo assim.
Claro que a verdade, verdadinha, é que não podemos mudar o passado. Não podemos mudar o nosso, como o corte de cabelo desastroso ou as nuances que nos fazem parecer uma zebra, a saia dos saldos que não dá com nada nem nos fica especialmente bem e muito menos as relações de que nos arrependemos com sacanas destrutivos e abusivos, não podemos mudar o deles. Podemos desejar que a(s) gaja(s) anterior(es) tenha(m) uma síndrome rara que as faça ficar com um rabo imenso ou ataques de urticária ou borbulhas inestéticas, mas não podemos apagar a sua presença na vida deles. Tudo o que seja escarafunchar nas relações passadas só nos vai deixar doloridas e irritadas. Em última análise, não vale a pena.
Nós, as mulheres, adoramos falar. Adoramos analisar, teorizar, especular sobre o que nos acontece, aconteceu, acontecerá, explicar e perceber tudo. Os homens, nisto, são muito mais inteligentes que nós, falam menos, perguntam menos, expõem-se menos, poupando assim uma considerável dose de chatices. Nesta questão de amores passados a palavra de ordem é o silêncio. Quanto menos se disser, melhor.
Aceitem, minhas amigas, que se fizerem perguntas, é melhor estarem preparadas para as respostas que podem não gostar. Aceitem que o passado é um país distante onde não podemos regressar, nem eles. E que toda a gente tem uma história até eles, e que é essa história que nos molda até sermos o que somos, como somos.
Se é duro aceitar, quando acaba uma relação, que somos personagens secundárias na vida de quem nos deixa, é igualmente duro aceitar, engolir, as personagens secundárias nas vidas deles, por mais transitórias e passageiras que tenham sido. Não nos conseguimos pôr no lugar delas porque estão perto, demasiado perto daquilo que nos afecta a nós, não há volta a dar-lhe.
Minhas queridas, há muito pouco, quase nada que podemos controlar na vida. As pessoas aproximam-se porque querem, da mesma maneira que se afastam porque querem. A vida prega-nos rasteiras constantemente e nada, lamento dizê-lo, dura para sempre. Tentar controlar o passado de quem está na nossa vida é tão fútil como querer controlar o nosso. Podemos interpretá-lo a uma luz diferente face ao que se passou a seguir mas mudá-lo, objectivamente, não podemos. Não há corrector para a vida, temos de seguir em frente, com rasuras e tudo.
Assim, quando lhes apetecer escarafunchar no passado, ou a eles no vosso, lembrem-se que não é especialmente uma boa ideia, e que o silêncio é, a maioria das vezes a melhor opção. Lembrem-se que, se perguntarem, podem ter respostas que doem e não vos agradam. E que agarrem-se ao que têm no agora e no aqui, o passado é imutável, o futuro incerto, só o presente, o amor sentido no aqui e agora conta. Tudo o resto são questões de pormenor para as quais é melhor ser cego, surdo e mudo. Juro.

4 comentários:

Anónimo disse...

Faz-me lembrar uma cena do "A few good men" onde o Tom Cruise diz ao Jack Nicholson que quer a verdade. O outro, com aquele sorriso típico diz-lhe: "You want the truth? You can't handle the truth!"
Tá mais que provado que tens razão. Mas te garanto que da proxima vez que virmos feridos na estrada vamos olhar com toda a atenção e vamaos, mais uma vez dissecar o que aconteceu: é uma compulsão natural, infelizmente.

Beijo

Su

Carocha disse...

palavras sábias!

Patricia Almeida Alves disse...

Amiguinha, sábias palavras... mas porque será que eles não pensam assim também... e continuam a perguntar sobre o que não querem ouvir?
beijos
Penelope

Passionária disse...

eles perguntam pelo mesmo motivo que nós, não conseguem evitar. Depois ficam chateados e era bem escusadinho que ficassem...
beijinhos a todas