Os sectores mais radicais do movimento feminista desaprovam vivamente uma fauna específica da sociedade: os surfistas. As que não os desaprovam por causa da sua atitude de beija-flor a saltaricar de "dama" em "dama" (um homem que chame dama a uma mulher só por si já merece o ostracismo eterno de qualquer mulher inteligente), desaprovam-nos pela sua visão reduzida da humanidade traduzida por um vocabulário de 500 palavras, sendo 250 relacionadas com mar, 50 com mulheres, 100 com roupas e 100 com tudo o que diz respeito a sair à noite.
Já eu, por mim, acho que nas circunstâncias adequadas um surfista pode até ter a sua piadita.Ser intelectual dá trabalho, ser militante também. Há muito livro que ler, muito jornal, muito concerto, muita música, muito teatro, muito filme. Há também muita conversa profunda às três da manhã sobre o sentido da vida ou a amoralidade em potencial do devo kantiano. Uma pessoa enche-se de stress. Só apetece deixar para trás os comentários à nova edição da Arte de Amar do Ovídeo e partir para um tempo onde tudo era mais simples. É nessa altura que os surfistas têm o seu papel. São fresquinhos e acalmam qualquer meninge, qualquer hipotálamo exaurido. O facto de não quererem saber sobre o défice democrático do Nepal (nem sequer onde fica o Nepal) só traz vantagens.
O arzinho dourado e saudável destes moços, sem pelinhos no peito e barba na cara, com um ar de eternos adolescentes até mesmo aos trinta e cinco tem tudo para nos encher de ternura e acalmar a mente. Depois raramente são companhias exigentes: sai-se para a noite sem grandes compromissos, têm-se relações passageiras sem espinhas nenhumas. Têm filhos pequenos ou cães grandes e uma colecção eterna de calças brancas de linho e camisas havaianas e colares rentes ao pescoço. São como pequenos raios de sol concentrado, mesmo a meio do Inverno. De resto, há que respeitar um homem que se mete na água fria no Inverno de livre vontade, não é?Claro que, como tudo, o consumo excessivo pode trazer sérias consequências: ciúmes, desespero por causa deles não crescerem nem assentarem, deserto intelectual. Num momento aproveitamos a vida com um belo espécime, noutro damos por nós a casar de páreo branco e descalças nas Seychelles- e nós detestamos areia- ligadas a um ser cuja noção de maturidade consiste em pôr um cinto nas calças quando vai visitar os papás. Trágico. Ou então reagimos a quente e fugimos, caindo nos braços do primeiro homem que saiba efectivamente que Brahms não é uma marca de cerveja brasileira.Por isso, minhas amigas, consumam com moderação, é como os bifes: sempre faz mal, mas pontualmente é muitíssimo agradável. Oh se é.
3 comentários:
eheheheh
Malandreca!!! Surfistas, hã?! De facto são especimens interessantes, mas por vezes com a capacidade intelectual de um grão de arroz(no geral).
Excelente como sempre, miguita!!!
Uma frota do costume,
C..
Está muito engraçado, Parabéns!
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