Fomos informados de quem seria o DJ da noite pelo seu filho de catorze anos, o que nos fez sentir incrivelmente velhos. Os DJ não têm filhos de catorze nos que por acaso até são nossos alunos, nem a música que nós ouvíamos aos catorze anos pode ser já usada para uma festa temática, pois não? Parece que sim.
A casa estava cheia, mas eram as miúdas adolescentes que mais estavam à anos oitenta, ainda não têm a capacidade de auto-ironia da gente; e resto já demos pra todos aqueles peditórios: botins de camurça com franjas, check, camisolona larga com ilustrações do Patrick Nagel, check, calças justinhas com All Stars, check, demasiado lápis preto e argolas enormes, vinte e três pulseiras com tachas de metal, check, check and check. Deus, como o tempo passa.
Para os miúdos que estavam lá, gente nascida nos finais dos oitenta e os noventa, ver-nos na discoteca era uma experiência entre o maravilhamento e o terror. Ver adultos, modelos de conformismo contra quem se rebelar, aliás, a dançar e cantar, perdidos nas músicas deve ter sido uma experiência estranhíssima, o mundo ao contrário. Depois, a nossa maneira de viver a música era completamente diferente, a músicas inteiras, com letras de rebeldia que gritar em vez da batida primitiva dos bocados das samples que agora ouvem e para as quais, sinceramente, estamos muito velhos e não temos pachorra nenhuma.
Deus, como éramos rebeldes, rebeldes contra tudo, de manhã com os riscos pretos e as calças dobradas ao fundo (duas dobras, fininhas, impensável sair de casa sem elas) mordíamos as rebeldias, rebeldes com os professores e as vidas e as expectativas e todas as autoridades. Agora, aburguesámo-nos, acomodámo-nos, demasiado sábios ou demasiado cansados pela vida para gritarmos como aos catorze anos, batermos com a porta, fazer uma fita, acreditar que podemos ser exactamente aquilo que queremos. Temos agora filhos e responsabilidades e empregos e alianças convenientes, rotinas estabelecidas, amores oficiais. Aqueles de nós que não os têm, por vontade ou capricho dos anos e da vida, amam muito mais cuidadosamente, nunca com o peito aberto que tínhamos antes: "I'll stop the worl and melt with you", gritavam os Modern English, "to die by your side, well the pleasure, the privilege is mine", respondem os Smith, Just like heaven, suspiram os Cure.
Envelhecemos, melhor, crescemos, para longe e para fora do que esperavam de nós, do que nós esperávamos. Temos agora esta consciência inevitável, com a maturidade, das nossas falhas, dos nossos erros, de todo o tempo perdido entre a nossa rebeldia dos catorze anos e a maturidade dos (meus) quase trinta e quatro. A consciência de saber que nunca mais seremos assim, como éramos nos oitenta. E não conseguir decidir se isso é uma coisa boa, se uma coisa má.