terça-feira, fevereiro 12, 2008

Os falecidos da viúva alegre


As coisas são como são. Quer tenhamos amado muito, pouco, assim-assim, quer seja amor da nossa bida balhamedeus ou um colossal erro de casting, as relações chegam ao fim. E a partir daí, perdemos um mais-que-tudo para ganharmos tristemente famosos ex. E como todas as coisas que nos acontecem, temos que os gerir de forma a manter a sanidade mental.
Há muitos anos já que me refiro aos meus ex-namorados como os meus falecidos. A reacção das pessoas é, ou de divertimento aprovador ou de uma espécie de horror fascinado, tipo sou tão cabra feminista que os mato logo. O motivo porque o faço não poderia estar mais longe de um desejo inteso de os ver esticar o pernil, de ver os seus coraçõezinhos negros e mentirosos parar de bater (apesar de, pontualmente,ter os meus momentos), mas sim uma estratégia de distanciamento psicológico, eu explico.
Quando conhecemos uma pessoa, e começamos uma relação, isso muda-nos, na linha da água filosófica que não passa duas vezes no mesmo rio. Somos outras pessoas. Construimos a nossa identidade para lá de nós, numa extensão de nós para sermos parte de um casal. E por mais incipiente ou ineficaz que esta alteração seja, não voltamos a ser como éramos. Podemos ser mais amargas ou mais cínicas, mais aliviadas ou mais sábias, mas não o mesmo que éramos antes de termos essas pessoas nas nossas vidas. Nesse sentido, e porque as pessoas que nos entram ou saem vida afora são uma espécie de cortes na nossa linha recta, a sua entrada ou saída são uma morte, no sentido de que aquilo que foi, não volta a ser.
Depois, a dimensão de viuvez é, igualmente, uma reflexão eminentemente prática. É que quando há um divórcio,uma ruptura, as coisas são difíceis e chatas de resolver e, quer se queira, quer não, há contas a acertar, bens a resolver, é uma coisa chata e arrastada. A morte não, após o choque do momento, o ritual de fim e o período de luto, as coisas ficam resolvidas, acabadas, arrumadas onde pertencem, no passado, porque da morte não se regressa. E eu acho que o fim de uma relação, se ela foi verdadeira e não superficial, é isso mesmo, uma morte. A partir daí temos de nos reconstruir do que ficou, que poderá ser mais forte e melhor, mas não como era. Só conseguimos reconstruir-nos sob as ruinas daquilo que foi, nada pode ficar de pé. É muito mais prático seguirmos em frente que tentarmos ter de volta o amante foragido, ou catalogar com requintes masoquistas os aspectos em que quem nos seguiu é melhor que nós. Um exercício desses não faz sentido e é, sobre todos os aspectos que se veja a coisa, uma estupidez galinácea a evitar a todo custo.
Com a passagem do tempo, o afastamento emocional de encarar as coisas assim, como um fim de onde temos de partir e não um ponto de chegada, ficamos bem. Como as viúvas, pomos pontualmente flores na campa do nosso amor perdido (ou da nossa inacreditável estupidez canina) e ala que se faz tarde. Temos, sem qualquer titude vingativa ou maldosa de os matar para seguirmos em frente. E conseguirmos a alegria e seguir em frente e amar de novo, ou ter umas reboladelas no feno ou whatever.

2 comentários:

elisa disse...

Pois, também é preciso fazer o luto das relações passada.E quando ele é bem feito, até nos podemos tornar melhores, mais fortes,mais bem preparados para viver de forma plena.
Beijocas

Anónimo disse...

As minhas ultimas relações antes de aparecer o "Tal" foram um bocado para o parvas, o primeiro demasiado jovem, o segundo bastante mais velho. Coisas da juventude!!! Acabaram por diferentes razões, mas de facto durante muito tempo também eu me referia a eles como os falecidos... e o primeiro passo que eu tomava era evitar a todo custo a mais pequena hipotese de contacto, encontro etc... mudei o meu numero de telefone, evitava frequentar os mesmos lugares etc. O facto é que esta atitude ajudou-me muito a digerir o fim dessas relações... e depois da tempestade, claro que veio a bonança! E depois das feridas curadas... aí ja estava pronta para mais uns beijos e amassos, ou como dizes "umas reboladelas no feno" :) Fica bem