Quando, há uns seis meses, decidi não comprar mais cigarros, não foi com aquela consciência total de tomar uma decisão tão portentosa. Seria, pensei na altura, uma espécie de experiência, pelo menos até ao fim das férias. Depois foi um dia atrás do outro, perdendo lentamente o hábito e as rotinas de fumadora de anos ( e eu sei exactamente quantos, só não digo é o número, credo). Mesmo agora, depois deste tempo sem fumar, não tenho ilusões em relação à natureza do vício, nem sequer, a propósito, faço proselitismo junto de outros fumadores. Cada um sabe do que quer fazer da sua vida e eu, mesmo sabendo do bem que me faz não fumar ( a minha pele nunca esteve tão bem, ou assim me dizem) ainda sinto saudades dos cigarros.
Não é por acaso que os vícios são tão populares. Se nunca fumaram não perceberão o que digo, mas acreditem, fumar é bom. Faz-nos muito mal, pois claro, mas é muito bom, mesmo a um nível físico de que não temos consciência. Quando deixamos de fumar, a privação da nicotina, de cuja dependência podíamos não ter consciência, faz-se sentir em toda a sua força, trazendo um desconforto físico terrível. Se a presença dos cigarros nos faz mal, a sua ausência faz-nos fisicamente pior. A ressaca, meus queridos, é um horror. Mesmo tendo os olhos no resultado final, uma vida mais saudável e livre da prisão do tabaco, noites há em que daríamos tudo o que temos e algumas coisas que não temos por só e apenas mais um cigarrinho.
Ocorreu-me outro dia o parecido com deixar de fumar que é sobreviver a certas relações. Não sei se isso acontece só comigo, que tenho aquilo a que chamam uma addictive personality (uma propensão para ficar viciada em qualquer coisa a que se seja exposta), se com todos. A verdade é que aquele desconforto, aquela vontade de ter só mais um pouquinho, mais uma dosezinha desse amor é igualzinha àquela vontade às três da manhã de mais um cigarro, só mais um e que se lixem as consequências.
Eventualmente ganha a razão e superamos o vício, passam as três da manhã e o desejo e é um dia novo, em que somos melhores, mais fortes e mais virtuosos, mais sábios por não termos cedido. Quando damos por conta passaram-se seis meses, um ano, dois ou três anos e os cigarros - ou o amor- são só recordações amargas e doces ao mesmo tempo. Mas não fico- não devemos ficar- convencidas com esta sabedoria recém-achada às quatro da manhã quando não fumámos ou não pegámos no telefone bem a meio de uma crise, não foi a última. Uma vez por outra, independentemente do tempo que passou, vai-nos invadir o desejo voraz por mais um bocadinho, por mais uma dose, e fará tanta falta como no primeiro dia em que decidimos abandonar o vício. E o círculo recomeça mais uma vez, até termos vencido, pela razão, mais uma vez, esse desejo irracional que só nos faz mal.
Não acredito que os vícios, como os amores, se superem totalmente, isso simplesmente não acontecem. Com calma, sem arrogância, conseguimos resistir. Mas curar? Não. Num canto da nossa mente lembrar-nos-emos de qual o gosto e a sensação de um cigarro na nossa boca, do toque do nosso amor na nossa pele. E naquele momento, mesmo que só nele, desejamos ter só mais um pouco. Só a sabedoria e a calma nos ajuda a superar.
Consegui parar com os cigarros, consegui parar com os amores. Vou continuar, recaídas à parte, a conseguir superar os vícios que tenho. Agora vamos ver se consigo aplicar esta sabedoria ao chocolate. Se conseguir, queridos, vou ser como a Mary Poppins, praticamente perfeita de todas as maneiras. E entretanto, enquanto não sou perfeita, obrigadinha por não fumarem perto de mim, mais vale não tentarmos o destino.
7 comentários:
Pois, os vicios..compensam o bem que sabe pelo mal que faz!
O chocolate...e coisinhas doces...tenho levado uma vida inteira e não consigo, é muito, mas muito impossível(grande bujarda gramatical!).lol.
Come chocolates , sim! Mas pouquinho.
Cara Passionária,
Fumei da década de sessenta até a década de noventa. Um dia meu cardiologista me avisou: - A coisa vai mal! Deixe o cigarro!
Deixei, mas até hoje adoro até o cheiro...
Mas acredito que não voltaria a fumar, a idéia de algo com tal ascendência sobre mim me assusta, prefiro não voltar do que ter que admitir minha fraqueza. Se bem que o cardiologista tenha ajudado muito...
Boa sorte na sua luta!!!
Ângela
Totalmente de acordo! Eu tenho a ilusão de controlar os cigarros e, enquanto assim for, ainda vou fumando, pouquinho...OS OUTROS VÍCIOS é que é pior: o chocolate, os doces...Enfim, podemos deixar de fumar, mas não podemos deixar de comer! Bjos, N
Totalmente de acordo! Eu tenho a ilusão de controlar os cigarros e, enquanto assim for, ainda vou fumando, pouquinho...OS OUTROS VÍCIOS é que é pior: o chocolate, os doces...Enfim, podemos deixar de fumar, mas não podemos deixar de comer! Bjos, N
Deixei de fumar há vinte e tal (credo! tantos!) anos e continuo fumador. Só que não exerço.
Quanto a fumarem perto de mim, gosto. Chama-se fumar à boleia.
OK, prometo não fumar por perto. O mesmo já não posso dizer relativamente à degustação de qualquer pedaço de chocolate. Aúnica ajuda que posso dar é devorá-los todos antes que lhes chegues!!:)))
Vicente da Rosa
Gosto da ideia de ser uma fumadora não-praticante, vicente.
Vicente r. , afasta-te dos meus chocolates sff, nunca é boa ideia interpor-se entre mim e eles ;).
Ai Nô, os vícios é que nos controlam, só se cortarmos de vez é que nos libertamos... pelo menos temporariamente. Tu viste-me com os três, os cigarros, os amores e os chocolates... dois desses já foram à vida. beijos.
Ângela, até ver ainda não recaí, esperamos que não aconteça. Gostava de dizer que deixei de fumar pelas razões certas, que é porque sou uma cidadã consciente, mas não foi assim. Suponho que o importante é ter deixado, independentemente dos motivos, não? Oh well.
Na mouche, bom dia, por alguma razão os vícios são vicios. normalmente estão associados ao prazer. Não sei quanto a ti, mas nos dias em que o mundo se une para nos tramar, só um quadradinho de chocolate reequilibra a balança...
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